terça-feira, agosto 16, 2011

Um relógio parado em 1975...!

simplesmente não consegui resistir
.
 .

 Nota: o poema foi postado respeitando o original em papel

O RELÓGIO
(a vida)

Junho de 1975

A vida é, como’as folhas’secas no Outono
Vem o vento, e elas, doce, lá se vão
Roçando-se pelas moléculas do ar
Desviadas de cada partícula, em abandono
Quedando por fim, silenciosas, a ‘pensar’

É rastilho de pólvora espalhada pelo chão
Perto de uma fogueira que arde intensa
Em que uma fagulha se escapa,
Por entre os guerreiros do ar se livra
E vai queimar a ponta que se acende
Rasga os céus, num arrepio, que abafa
O crepitar dos pés que a ela se atira

Assim é a vida.
É um caminhar constante e errante
Por estradas de muitos caminhos
Que nos leva ao fim, que conhecemos.
_ É Adão pai venerável, sôfrego amante
‘Animalesco’, que no pecado se aninha
E lega’uma crença que não cremos

É o pendular movimento
Que dá horas dá alento;
É o perdão de Júpiter
Nos trovões que nos confere
_ É o vergar duma Cecoia
E o corpear de uma jibóia;
´_ A recordação que nos assalta
O presente que nos abraça
O futuro que chama sorrindo
A nós, os homens famintos

É a luta da semente na terra lavrada
O esforço dos raios do sol que nos revive
Cada dia, de novo, nos prepara lestos
O sussurrar cúmplice de uma queimada
Tamborear mudo do coração que vive
E as mãos ávidas que nos dão afecto.

Somos em nossas vidas tudo isto;
Somos bancos de escola, verde jardim
Gaiatos que correm alegres por correr
Ratos de palmeira macacos e esquilos
Cordão de bolsa, flor, no prado um jasmim!
Ou a rosa em botão, linda, que não quero colher;
Somos rios de pranto na montanha das faces
Estacas vivas, espantalhos no milheiral
Arrotos digestivos nas bocas descarnadas
Sorrisos de troça sem charme ou classe
Eva encantada com um Adão brutal
Ou resmungo de uma velha quase findada.

Acredita amigo!
Amigo mendigo
A vida é segredo
É branco é negro
Raiz quadrada
Monge de cruzada;
É Ilíada, Odisseia
Pão servido à ceia
Magazine, asilo
Eça e Primo Basílio
Hugo Verdi, Garibaldi
Luanda, Baía, Matadi

São ruas cheias de gente apressada
Portões ferrugentos, damas finas vira latas;

São gatos, um felino
Casacos de arminho
Aperitivo e conforto
Bordéus ou bom Porto
Médicos e judeus
Crentes e ateus!

É um operário fatigado, ainda a construir
Aluno em exame, examinado a dormir
Poluição ruidosa, quase silenciosa
Que caminha na multidão densa e viscosa

“É um idem ou vice-versa
Um romance ou um poeta;
_ Rato ligeiro numa viela”

É o coração, juiz num tribunal em festa
Um padre casamenteiro que ‘diz missa’
Um jovem noivo que vai desposar
Filhos, pais que o hão-de ser depressa
Uma mãe, uma filha que nada risca
E uma vontade louca de me calar!

A vida és tu
Sou eu que quero o que é meu
_ Sou eu que agora
Desprezado e findo, choro
Como os olhos cheios de água
Esta dor, esta mágoa…
A vida, a minha, és tu!

Adolfo Inácio
Cito Loio

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