sexta-feira, junho 11, 2010

“Katans”


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“Katans”

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Em nome deles, os agradecimentos ao senhor Dr. António Barreto, pela defesa dos ex combatentes do Ultramar

CITO

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Os diversos documentários televisivos têm trazido a lume muita da desgraça que se passou em terras de África e muita história mal contada, com omissões, e por vezes empolgamento de situações que tão pouco são relevantes.

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Passados mais de três décadas vêm de novo trazer à ribalta do consciente tudo o que as vicissitudes da vida conseguem manter nos claustros no inconsciente.

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São passagens históricas colectivas, suportadas por vezes por relatos pessoais, dolorosos inconformados. Lavamos a alma com catarses de tristeza e dor, e com alegria misturada.

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Como tantos, também sou dos que tem as imagens a bailar, os sons das balas a cair nos telhados de zinco, as tracejantes a iluminarem a Renault 4 L que fazia voar pelas ruas mal amanhadas dos Muceques/bairros Periféricos da cidade de Luanda.

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Recordo-me também da cidade do Huambo, das viagens loucas às 6ª feiras para chegar a Luanda a tempo de curtir uma febre de Flamingo ou da Disco 4 até altas horas da matina, terminando a noite num farfalhar de coxas nas mornas areias da ponta da ilha, bem afastado do bisbilhoteiro farol

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Fazia-se nesse tempo a Instrução em Nova Lisboa, rogando que a gaita da tropa acabasse, que o povo esperava a Geração Brilhante para transformar Angola no maior país da costa Ocidental de África – nem pensar ficar atrás dos Sul-africanos.

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Quando recordo, ou vejo recordar tempos idos, passagens que ficaram apagadas nas mentes de cada um desses jovens carregados de sonhos, a palavra TRAIÇÃO continua a encabeçar o dicionário do desespero, uma traição que não foi só aos portugueses nem aos angolanos que acreditavam que o país seria um paraíso, depois de um dia se alcançar a Independência.

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Recordo-me de outros homens que de igual modo mereciam uma referência nos anais da história de uma guerra que nunca deveria ter acontecido.

Que gaita é a vida que nojo metem os revolucionários de cravos na lapela.

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Eles devem pedidos de desculpa a tantos que nem sei o nome. Mas lembram-se de edificar sumptuosos monumentos aos que tombaram no Ultramar.

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Muitos dos outros não se sabe o nome nem a data do seu enterro, nem edificam a “memória” dos que não tombando continuam caídos no esquecimento.

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Um dia, em Nova Lisboa, ainda rapaz, chamaram-me ao comando militar e disseram-me.

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"Vais dar instrução de armas pesadas ao pelotão de Katangueses".

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E fui, e percebi a diferença entre um guerrilheiro, e um matreiro, quem defende a honra, a vida dos seus, e um pedaço de terra pensando que um dia a poderiam ter para cultivar a mandioca, e os que, sentados nas esplanadas das capitais da Europa da Vaidade, bebiam às custa dos papás, Rum com Coca Cola, Vodka com Laranja, Baccard com Limão, e khäviar antes do Filet Mignon.

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Hoje, depois de tantos anos de tentativa de branqueamento de um passado glorioso de tanta mentira, pergunto se alguma vez o Estado Português pediu "desculpa" por ter TRAÍDO aqueles “Katans” que mal falavam a língua lusitana, mas que acreditavam que Portugal podia, vir a ser o seu País. Eram guerreiros, mercenários, homens sem pátria, e que me ensinaram que ser Homem não é coisa de meninos – é mesmo só para homens.




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