quarta-feira, novembro 04, 2009

Os olhos que nunca vi ...


Uma Persiana na Janela

.

Avé

Maria

do

Carmo


A vinte e oito de Outubro de mil novecentos e cinquenta e três, dia de São Judas Tadeu, às vinte e duas horas, numa casa de saúde privada da cidade de Luanda, nascia (mais) um rapaz de raça “mista”; assim lavraram no registo.

.

Era uma quarta-feira, de noite cálida e céu estrelado.

.

Ao final do segundo dia, Maria do Carmo começa a sentir contracções dos músculos mandibulares, e dificuldades em abrir a boca; não se sentia bem, sofria.

Os médicos entram em pânico; ela permanece lúcida e sem febre, os espasmos dos músculos das costas e o arqueamento do corpo dão indicações do que estava a passar.

Apareceram os primeiros espasmos dos músculos secundários.

Ao terceiro dia a febre aumentou quatro graus; a rigidez era de tal forma acentuada que não conseguia ingerir alimentos.

.

Dia um do mês de finados, a situação era incontrolável com espasmos constantes, a tensão arterial disparara e entrara em taquicardia.

A morte anunciava-se, vestira uma bata branca, e trazia ao seu lado o sorriso da vitória. Até àquele dia ninguém a conseguira vencer.

.Maria do Carmo asfixiava a cada hora, e cada hora contava com os mesmos minutos, os mesmos três mil e seiscentos segundo de agonia.

Envenenava-se , o coração acabaria por deixar de bater, e ela estaria lúcida no exacto momento em que olhasse um Deus que não tinha a sua cor.

.


Na madrugada de Novembro, depois de registar um nascimento, o mesmo médico assinava um óbito.

Falecera com vinte anos de idade aquela que fora mãe ausente por sete dias, e uma recordação por toda uma vida.


 
Web Analytics