quarta-feira, dezembro 08, 2010

Bom Natal 2010

Mensagem de Natal

Hoje, 8 de Dezembro, celebro o Dia das minhas mães desejando a todos Boas Festas, especialmente para ti que verteste uma lágrima em desespero pelos que apenas têm noite, e à mesa no próximo Natal, as estrelas como família.


UM LUGAR A MENOS


Hoje, sentado frente ao PC, olhei sem querer o livro de Eça, “As minas de Salomão” lembrei-me do Suave Milagre, de quantos milagres o mundo necessita para que a Paz fosse o “pão-nosso” de cada dia, e a suave alegria de cada conto que há em nós.

Neste deambular do pensamento vagueei por tempos que não voltam mais, a não ser na lembrança, bem antes da prima Alzheimer começar a embirrar com as nossas brincadeiras.
Neste pensamento, irreflectido, mas cheio de comiseração pelo próximo, recordei-me do meu amigo Cito, das suas gargalhadas, o rebolar pelos bancos de areia nas mornas praias de um Continente que por muito que tente jamais será branco; quando muito amarelo.

Decorria “um ano e Cristo”, talvez já 50, a azáfama apertava com a chegada de mais um Natal á moda metropolitana, em quem a família extensa se uniria em torno das filhoses, rabanadas, e do mousse de chocolate que não podia faltar ou o sacaninha do Cito armava uma chinfrineira que nem Egas Moniz evitaria mesmo com corda ao pescoço.

O tradicional Bacalhau com todos o arroz de polvo acompanhados com filetes fritos enrolado em ovo e farinha do mesmo molusco, os aperitivos, os vinhos de entrada da permanência e da saída, e, claro, a estuporada missa do Galo...a tal que o danado do catraio abominava, não porque fosse obrigado a mamar a estopada do padre a falar de coisas que não lhe diziam respeito, mas porque atrasava a única parte interessante de um Natal de adultos: a entrega de prendas, num tipo de cerimónia quase tão mediática como a gala os Globos de ouro de Hollywood.

Cito detestava a missa, e sobretudo aquela comida, e só se salvaria de uma barrigada de fome com o cabrito assado que o Xico, o “empregado maior” da casa, assaria no quintal, junto ao coqueiro, com cuidado para não pegar fogo ao barco que estava estacionado anexo ao muro que dava para casa do seu “mano” Tomás, e antes de ir para a sua própria casa passar também ele o Natal dos Simples.

Aquele tipo de festa deixava-o stressado, e nesse ano ainda era notório porque já sabia que o Pai Natal era treta, e, mais que certo a bicicleta de duas rodas e selim “à homem” estava no papo!

Desde de manhã que consumia a cabeça à “mãe”, ao ponto desta o mandar desopilar, ir catar pulgas para casa dos amigos, que sarna, já chegava a que apanhava no resto do ano.

Foi o que o pingente encardido quis ouvir; depois do almoço pegou os “quedes” bola de catechu, sorriso de vitória nos beiços, e pernas para que te quero que o dia era largo e só voltava a ver pessoas chatas à hora da ceia, porque nesse dia, anulava-se o jantar.

Tinha tempo, seguramente sete ou oito horas de vadiagem peregrina, e pontapé na bola e nas pedras que também rolavam.

O calor apertava, a praia apertava com ele, e a escapadela até à Ilha, a pé, com os amigos, era como limpar o rabo a meninos – se ele e os amigos pensaram, quando terminaram o esforço de colocar as mentes a funcionar, já estavam na areia em tons de creme de uma praia de curtição, entre uma de chutos de avançado-centro e voos “à verdadeiro keeper”

O tempo estava divinal o horizonte em tons de paraíso matizado de vermelho suave e azul de forme, (sim, porque quando se tem fome e nos oferecem um prato de sopa vemos nele reflectido o céu), o oceano, a que eles chamavam a nossa praia, apalpava as nádegas ao universo mostrando aquele pôr-do-sol o início da estrada da vida de cada um, em que os sonhos se espraiariam pelos anos ajudando a construir, como aquele que ainda só colhiam as prendas, os natais das suas próprias famílias.

De regresso casa, entre ruas alcatroadas e o assanhar dos cães à passagem, corridas atrás dos machimbombos, uma assobiadela à miúda que brincava ao hualaup com o aro que ganhara no ano anterior, Cito imaginava-se a pedalar pelos passeios das avenidas, na companhia do Sebastião, o criado de casa, que para além de estudar pouco e brincar com ele, pouco mais fazia.

Sebas, ia ao pão, à loja, por vezes fazia um recado a uma das tias do “menino patrão”, jogava à bola e levava porrada da ama-Madalena, a lavadeira e 2ª oficial de plantão à cozinha lá de casa e mestra em dar uns açoites no palerma do Cito quando este fintava a “mãe”

Fora uma tarde de gritos, soltara o diabo do corpo, e o pior estava para vir: o banho antes de ir para a mesa.

_ Bolas para que tenho de tomar banho se amanhã não há escola? A velha é mesmo chata com a mania das limpezas; pelo menos hoje podia esquecer-se – já sei, vou pedir à Natividade que finja que me vai dar banho, e vamos jogar ao abafa!

Sabia que este pensamento não passava de um desejo, porque, se quisesse sentar o rabo à mesa, tinha de ter uma conversa como o OMO, que mesmo lavando mais branco como diziam, nunca lhe mudara a cor – e continuava nos seus pensamentos vertiginosos.

_ Nunca percebi como é que o menino Jesus fala todas as línguas! Será que ele também sabe quimbundo?

A tarde fizera uma vénia à noite, o banho, com sacrifício fora tomado a mesa estava pronta, e a família começara a chegar; já estava mais de metade, e a outra não tardaria, que a Rainha-mãe não suportava atrasos e muito menos por parte dos filhos, já que à peste do “neto” sempre facilitava – como era uma mulher inteligente preferia comprar um atraso pelo preço do descanso que este proporcionava depois do almoço, e durante todo o período das férias escolares.

A música entoava, escutava-se uma pianada de Mozart, depois veio Chopin, para acompanhar a cachimbada do tio, enquanto contava s petas sobre a última pescaria, a tal que os “velhos”, por serem tão bons nas coisas da cana de pesca, tinham esgotado o pargo em toda a costa africana – Cito deliciava-se com as histórias.

_ Não sei como os peixes voltam a nascer depois de serem todos pescados!>

A hora chegara; o avô encaminhara-se lentamente para a mesa, em sinal que, era tempo de agradecer ao Senhor aquela fartura.

Cerca de 30 membros estariam nesse Natal reunidos; já houvera mais mas alguns tinham “viajado” e não voltariam a sentar-se nem àquela e nem a qualquer outra mesa – haveria os que estavam muito distantes, e todos compreendiam que os gastos com as viagens seriam muito elevados para passar apenas um dia.

Cito, passa os olhos pela mesa, grande e estendida por todo o espaço da enorme sala de jantar envidraçada; alguma coisa não batia certo naquele momento. Na sua cabeça esgrouviada os sinos não badalavam, a palavra do Senhor era um dizer mudo, a família dele não estava completa!

Tios, mulheres e maridos dos tios e das tias, primos e primas, cunhados genros irmãos o Pitadas, o seu “personal dog” mas faltava uma pessoa. Não queria acreditar, que Sebastião ainda não tivesse chegado, sabendo que a patroa não alinhava em faltas não justificadas.

A sua cara abria-se de espanto, o sorriso metera férias, a saliva entrara em greve e os olhos pareciam querer tocar as sobrancelhas; contou as cadeiras e estavam todas ocupadas e deixou escapar um abafado rugido

A “mãe”, ao reparar no semblante do neto, perguntou-lhe em voz serena e tom moderado:

_ Falta-te alguma coisa menino?

Nem queria acreditar; de que raio era feito o Pai Natal, porque razão no quadro da ceia de Cristo estavam todos sentados do mesmo lado. Porque não havia mais mulheres se eles eram todos “velhos” – se aquela refeição deveria de ser de alegria para todos porque é que “Sebas” não estava, e nem lhe dissera onde ia.

Começara a fazer-se luz no cerebrozinho à medida que analisava uma a uma a carantonha dos que já estavam sentados e a dar ao corta-palha. Olhou fixamente para a “mãe” e respondeu:

_ Falta uma cadeira mãe!

Nesse ano, Cito recebeu a sua “xica” com tristeza, não deu “paleio” aos primos, e não quis adormecer nos braços da prima Rosa como fazia todas as noites, em que se enroscava nela, sonhando com a amiguinha que vivia na casa em frente, do outros lado da avenida.

Só na semana seguinte voltou a ver Sebastião – fora passar o Natal ao seu Quimbo

Adolfo Castelbranco

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