Viste-me nascer...!
A DÁDIVA
(poema 29)
Viste-me nascer
terra quente e fértil;
estendeste-me os braços
acarinhaste-me…
com a doçura dos teus haveres
Sim, tu, terra que foste meu berço
meu quintal minha cama
minha amada minha ama,
deixaste florir em teus olhos
mocidades libertas, apaixonadas
pela grandiosidade das matas!
Tu que recolheste em teu colo
belezas sem par, homens fortes
de pensamentos rectos
viste-te subitamente
assaltada ultrajada
devedora de credores
devassada pelos horrores
enraizados já nos fetos
antes de serem homens
antes de sem nada
E eu, hoje…
já crescido já criado
com olhos plenos e lágrimas
vejo-te como nunca queria ver
nunca gostaria de saber
que um colosso…primitivo
humano e bondoso
tivesse a cabeça
onde os pés têm os mendigos.
Por mim,
nunca passou o pensamento
de ter em minhas mãos
estratos do teu ventre
fios do teu cabelo
negro e crespo
gostas pálidas do teu sangue
sangue que já não…
te banha o coração
Não te lamentas
não choras!
aceitas submisso
as grilhetas que te acorrentam
despojando da nobreza
antes mais forte que fortalezas
de almas que não penam
_Tu, arrastas-te
qual vulcão extinguido
frio e inerte
cansado de lutar
por causa justa
por causa tua
e abandonaste-te à sorte
de veres achada
qual a barca que vai para o norte
distante paragem, longe de mim
longe dos teus; escondida.
_ Não! não há em mim crença
ao ver-te estendida
entre a terra e o mar,
entre o vento e o ar
cheio de flores podadas,
de homens rodeada
Pega nas armas, ataca
corre pelo campo árido
da guerra justa e merecida;
crianças a brincam no teu pátio,
sinal que não és vencida.
_ Liberta-te terra benigna
desvenda esse enigma
e poderá mostrar
que tens algo para dar;
sonhos que sonhei
cânticos que inventei
servir-te-ão para embalar
felizes criaturas do mundo
numa terra,
que tem muito para dar.
Pode o mundo estremecer
grandes, colossos, tremer;
pode tudo, tudo mudar
ficarás imutável a olhar
olhando em frente
sorrindo sempre
não voltando a temer
de um dia voltar a ceder
Pertences à raça pura
do sol de África
és sólido penetrável
trabalhadora incansável;
Levanta-te e anda!
ninguém pára nem descansa
oh! minha terra minha dita
recompensa-me do amor
suspende a minha dor
e dá-me…; dá-me cor.
Cito Loio
23/24 Novembro de 1973
01 h 25m
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