Luto que o império teceu
O
FILHO
DA QUITANDEIRA
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Alguidar fartado
de encardida roupa
lavada à
noite, abraçada à dúvida.
- Galhofava
na rua a multidão louca
que ia colorindo
a concórdia pública
com fumo de
cigarros de liamba,
desde a
entrada do Grafanil à Mutamba
Raiava-lhe o
dia e quitanda à cabeça
apregoava, tem
Carapau e chicharro
…passa amanhã
não se esqueça,
chiça pró
raio do velhote com catarro,
encontramo-nos
mais logo na matiné
que agora
estou no ir irmão…inté!
E a
rapaziada na esplanada da preguiça
curtia a
juventude sem olhar a raças,
jeans quedes
e uma singular premissa;
_ vestir
camisa engomada, sem traças,
longe dos
ventos soprados de leste
transportando
pouco mais que a peste.
Mas chegara
a obrigatória incorporação.
- João
Sábado alinha numa de desertor
e pra q’a
quitandeira Domingas Purificação
não viesse a
usar as missangas da dor
vai para a
mata plantar árvores socialistas,
saudar
Lenine e outros sabidos pacifistas
Enganara-se
a história, já finda a guerra
antecipando-se
à revolução dos cravos,
feita por
gentalha que vivia noutra esfera,
governando-se
à custa de muitos parvos
reaccionários
perversos e colonialistas…
…alguns
(quiçá) de ideais anarquistas
E à causa da
luta pelo corrosivo poder
viraram-se
irmãos contra irmãos, primos
tios pais
cachorros tarecos, sem tremer
alvejando
até os mais íntimos amigos
querendo
ficar na foto duma independência,
dada, com as
visíveis assinaturas da indecência
Ferido de
morte, ano de 75, a 23 de Outubro
tombava o
único filho de uma quitandeira
mascarrando poeirenta
terra de sangue rubro,
ignorando quem
era o pai, nascido na Ribeira
ignoto
militar. - Afinal quem não conheceu
o negro luto
nas malhas que o Império teceu!
Cito Loio
28-29/8/2015
(De Agosto
de 1975 a Agosto de 2015)
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